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Show  •  05/07/2023

Chiquinha Gonzaga e Pixinguinha: O embranquecimento do choro e a negritude apagada

Foto: Elis Rockenbach

No contexto musical brasileiro, o Choro e o Samba são gêneros de extrema importância cultural, entretanto, há uma lacuna na discussão sobre o processo de embranquecimento que ocorreu nesses estilos musicais. A pesquisadora Glaw Nader, em seu recente artigo, parte de sua pesquisa em decolonialidade no espaço acadêmico, traz à tona essa questão relevante. Seu estudo aborda as relações de trabalho, o racismo, o machismo e as subcondições enfrentadas pelos artistas negros nesse cenário, bem como destaca a aposentadoria forçada de Pixinguinha em favor de Radamés Gnatalli.

O objetivo do trabalho e a trajetória de Chiquinha Gonzaga: Nesse estudo, o objetivo é discutir o processo de embranquecimento no Choro e, consequentemente, no Samba, à luz das trajetórias de dois grandes nomes da música popular brasileira: Chiquinha Gonzaga (1847) e Pixinguinha (1897). O Choro teve suas origens na Pequena África, região central do Rio de Janeiro, reduto dos negros vindos da Bahia. Ali se desenvolveram e resistiram sob as tradições africanas o Choro, o maxixe, o samba e o candomblé, presentes nas festas nas casas das tias baianas fundamentais para a história da música afro-brasileira, como Durvalina e Tia Ciata. No entanto, poucas eram as figuras femininas registradas na época do Choro, sendo Chiquinha Gonzaga e Lily São Paulo as únicas musicistas citadas nos registros históricos.

A negritude apagada de Chiquinha Gonzaga: Ao abordar a figura de Chiquinha Gonzaga, é necessário resgatar sua negritude, que ao longo da história foi apagada, cedendo lugar a uma falsa imagem de branquitude, reforçada pelas inúmeras representações da musicista tanto no teatro quanto na televisão. A perspectiva interseccional permite compreender como a articulação entre categorias como gênero e raça é fundamental para compreender sua trajetória como mulher negra. Chiquinha Gonzaga enfrentou o machismo e o sexismo presentes nos ambientes de produção musical de sua época, e sua imagem continua sendo disputada, persistindo em branquear personagens negros da história do Brasil.

A aposentadoria forçada de Pixinguinha: Da mesma forma, ao falar sobre o Choro, é imprescindível mencionar Pixinguinha. Nascido Alfredo da Rocha Vianna Filho (1897-1973), o instrumentista, compositor e arranjador, Pixinguinha é uma figura importante na história do Choro. No entanto, ele vivenciou um momento peculiar de embranquecimento na estética sonora do Choro e do Samba quando trabalhava como principal arranjador da gravadora Victor, sendo substituído por Radamés Gnatalli. Essa substituição revela o processo de “branqueamento” que ocorria na cultura brasileira em geral e afetava especialmente a produção musical da época.

Ao acompanhar as trajetórias de Chiquinha Gonzaga e Pixinguinha, é possível apontar e discutir como o processo de embranquecimento ocorreu, evidenciando como o projeto político eugenista pós-abolição contribuiu para apagar a negritude não apenas da imagem dos artistas, como ocorreu com Chiquinha Gonzaga, mas também na estética sonora embranquecida. Essa perda da identidade e da representatividade negra nas rodas de Choro reflete-se no predomínio de músicos brancos e de um público branco elitizado atualmente. É fundamental que essa discussão seja ampliada e que assim, possa-se retomar o protagonismo negro na história e nas práticas musicais brasileiras.

O artigo completo pode ser conferido aqui.